Por: Tyrso Muñoz
Falar a respeito da presença de
“negro” no Amazonas é tarefa muito difícil, apesar de sua enorme contribuição
sócio cultural. Somente a partir da década de trinta do século passado surgiram
os primeiros estudos sobre esse fato histórico na Amazônia (Funes 1995).
Porém,, graças a boa vontade e interesse de alguns escritores e pesquisadores
locais e estrangeiros, a cultura negra e indígena não permaneceram no
anonimato.
As primeiras informações oficiais
sobre o desembarque de escravos para Itacoatiara data de 1857. Período em que
por ordem do Ministério da Justiça do Império do Brasil, foi transferido de
Pernambuco um grupo de 36 escravos para o Amazonas, de um total de 50
apreendidos de navios que faziam o tráfico negreiro, entre África e o litoral
nordestino.
Por influência de Irineu
Evangelista de Souza (Barão de Mauá), os 36 negros foram enviados para
trabalhar na Vila de Serpa (atual Itacoatiara), na antiga Colônia
Agroindustrial, empreendimento constituído por Mauá. Com à falência da Colônia Agroindustrial, esses trabalhadores negros em
sua maioria refugiaram-se nas terras que
margeiam o lago de Serpa em Itacoatiara.
Esse fato tipifica a formação de núcleo populacional chamado de
“Quilombos”. Atualmente, boa parte de remanescentes das primeiras famílias que,
ocupou a área dos arredores do lago de Serpa, ainda vivem do extrativismo e da
agricultura.
A luta para garantir os direitos,
fortalecer a cidadania, consolidando a batalha contra o “racismo” e a
discriminação sofrida pelos povos e Comunidades tradicionais de matriz
africana, deu um passo muito grande, quando o Brasil na década de 60, foi
signatário da Convenção da Organização Internacional do Trabalho, que protegeu
e promoveu políticas públicas, favorecendo o aparecimento no Brasil de
políticas Afirmativas para populações
afros descendentes, indígenas e ciganos.
Outro fator importante para que
as desigualdades raciais fossem reconhecidas e abordadas em diferentes esferas
de governo, foi quando em 09 de outubro de 2003, o Presidente Luiz Inácio Lula
da Silva, sancionou a Lei 10.639, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (LDO) do ano de 1996, instituindo a obrigatoriedade do ensino de
História e Cultura Afro Brasileira e africana nas Escolas de Ensino Fundamental
e Médio do Sistema Público e privado, atendendo a uma antiga reivindicação do
Movimento Negro, fazendo com que pequena parte da dívida contraída pelo Poder
Público Brasileiro com a raça negra fosse aliviada.
Em Itacoatiara, realizamos
movimento em favor do reconhecimento da Comunidade Quilombola do lago de Serpa,
iniciando o mesmo, com pesquisa de campo e um relacionamento muito forte
frequente e humano com a Comunidade do Sagrado Coração de Jesus do lago de
Serpa, formada principalmente pelas famílias Macedo, Barros, Sabinos, Melo,
Nascimento, Alencar, Cantuária, Oliveira dentre outras.
Através de Ação conjunta com os
companheiros Claudemilson Nonato (Professor Mestre), a Técnica Daniele Miranda
Batista e o Técnico João Vieira. Participamos de inúmeras reuniões, realizações
de palestras informativas, colhemos vários depoimentos e consultamos livros com
pareceres de diversos escritores e pesquisadores, dentre eles: Francisco Gomes
da Silva, Sylvia Aranha, Oyama Ituassu, Antônio Loureiro, Arthur César Ferreira
Reis, Welter Henry Bates, Francois August Biard. Com a colaboração do jornalista Rui Sá
Chaves, esses livros foram copiados e anexados juntos a dossiê contendo
levantamento histórico da Comunidade e centenas de assinaturas de comunitários
que se autodefiniram como remanescentes
“quilombolas”. Todos esses documentos foram enviados para a Fundação Cultural Palmares em
Brasília, criada pela Lei nº 7.668, de 22 de agosto de 1988. Para a
consolidação desse apoio tiveram a constante orientação do Luís Fernando, militante
negro, membro do “Instituto Canga Zumba”
sediado em Manaus e de representantes do ITEAM (Instituto de Terras do
Amazonas), que não mediram esforços para apoiar o movimento.
Nos dias 11 e 12 de setembro de
2014, eu, o Professora Claudemilson Nonato e o Professor Reinaldo Souza e sua
equipe da SEDUC-Itacoatiara, participamos do Seminário potencializando a pauta
da Promoção da Igualdade Racial e Combate ao Racismo no Amazonas: políticas
públicas, espaços de Poder e Movimento Sociais em diálogo. No encontro o
Professor Reinaldo dos Santos, representando a SEDUC – Itacoatiara, fez uma
palestra sobre seu trabalho de implementação de duas turmas do EJA na Escola
Municipal Cassiano Secundo Nunes na
Comunidade do Sagrado Coração do lago de Serpa. O Professor Claudemilson
Nonato, explanou sobre a História do
surgimento da raça negra no Município de Itacoatiara. Em seguida exibi o vídeo
documentário realizado por mim, sobre
a historiografia da Comunidade do lago de Serpa. Conhecemos Alexandre
Reis, Diretor do Departamento de Proteção do Patrimônio Afro-Brasileiro, que na
Comunidade do Sagrado Coração de Jesus do lago de Serpa, na relação dos
processos abertos e aguardando certificação.
No mês de dezembro de 2014, para
a surpresa de todos, fomos informados que de acordo com o Diário Oficial da
União nº 239, o Presidente da Fundação Cultural Palmares – FCP, José Hilton
Santos Almeida, no uso de suas atribuições legais conferidas pelo Artigo 1º da
Lei nº 7.668, resolve: certificar a Comunidade de Sagrado Coração de Jesus do
lago de Serpa, conforme a declaração de autodefinição em Comunidade
“Quilombola”. Uma vitória da Comunidade do lago de Serpa, do povo de
Itacoatiara e do Amazonas, a ser contada brevemente no livro “Nasci nas Matas e
não Tenho Senhor” do Mestre Claudemilson Nonato.
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